
A Bíblia Sagrada é uma biblioteca de livros que fala através de histórias, leis, poesias e profecias. Mas, para o leitor atento, ela também revela sua mensagem por meio de uma linguagem mais sutil e profunda: a linguagem dos números. Por que o número 7 permeia toda a narrativa da Criação? O que significa o período de 40 dias de Jesus no deserto? E o misterioso 153 dos peixes, ou o aterrorizante 666 do Apocalipse? Estas não são coincidências. Elas nos introduzem a um conceito fascinante do mundo bíblico: a Gematria, a prática de atribuir significado espiritual aos números. Este artigo é um guia católico completo e profundo sobre este tema. Vamos além da superficialidade, explorando suas origens, analisando seus usos nas Escrituras e, o mais importante, oferecendo uma visão pastoral clara e segura sobre como um católico deve se relacionar com essa rica simbologia, sempre com os pés firmes na Doutrina da Igreja.
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O Que é Gematria? Uma Jornada da Matemática à Mística
Em sua definição técnica, a Gematria (provavelmente derivada do grego geometria) é um sistema hermenêutico que atribui um valor numérico fixo a cada letra de um alfabeto. No contexto bíblico, refere-se quase que exclusivamente ao alfabeto hebraico (e, por extensão, ao grego koiné). Como cada letra hebraica possui um valor (por exemplo, Alef = 1, Bet = 2, etc.), qualquer palavra ou frase pode ser somada para produzir um total numérico.
A premissa fundamental da Gematria é que palavras ou frases que compartilham o mesmo valor numérico estão intrinsicamente conectadas em um nível espiritual ou temático. Isso permitia aos rabinos e estudiosos judeus criar midrashim (investigações interpretativas) profundos, descobrindo relações surpreendentes entre conceitos aparentemente desconexos no Texto Sagrado.
É crucial, desde o início, fazer uma distinção vital:
- Gematria como Ferramenta Literária e Teológica: Seu uso original era como uma lente de aumento para explorar as infinitas camadas de significado da Torá. Era um exercício de piedade intelectual, não de adivinhação.
- Numerologia como Prática Esotérica: A numerologia, como comumente entendida hoje, muitas vezes busca prever o futuro, definir personalidades ou descobrir “destinos” com base em números isolados da vida de uma pessoa (data de nascimento, nome, etc.). Esta abordagem é estranha à fé judaico-cristã.
A Gematria bíblica, portanto, não é sobre “ler a sorte” com números, mas sobre “ler” a coesão e a profundidade da própria Revelação de Deus.
Origens e Contexto: O Mundo Antigo e a Linguagem dos Números
Para entender a Gematria, precisamos sair de nossa mentalidade moderna, ocidental e científica, e adentrar o mundo antigo, onde o universo era visto como uma criação ordenada e cheia de significados. Os números não eram entidades abstratas, mas princípios ativos da criação, carregados de simbolismo.
- As Origens no Antigo Oriente Próximo: A prática de atribuir valores numéricos a letras era comum em várias culturas, como a grega (isopsephia) e a mesopotâmica. Os judeus, durante o exílio na Babilônia, provavelmente absorveram e adaptaram essas ideias, refinando-as para o estudo de sua própria língua e textos sagrados.
- O Alfabeto Hebraico como Fundação: O alfabeto hebraico, com suas 22 letras, é a pedra angular da Gematria. Sua estrutura mesma é vista como divina. A primeira letra, Alef (valor 1), representa Deus, a unidade primordial. A última, Tav (valor 400), representa a totalidade, o cosmos. Toda a criação, portanto, estaria contida simbolicamente entre o Alef e o Tav.
- O Período do Segundo Templo: Foi especialmente no período entre o retorno do exílio e a destruição do Segundo Templo (c. 515 a.C. – 70 d.C.) que a Gematria floresceu entre os fariseus e os essênios (como atestam os Manuscritos do Mar Morto). Este foi um tempo de intensa reflexão teológica e esperança messiânica, e a Gematria era uma ferramenta para desvendar os segredos da Torá e os tempos do fim.
- A Influência da Cabala: Posteriormente, a Gematria foi adotada e radicalmente expandida pela Cabala judaica medieval, um sistema de misticismo esotérico. É fundamental destacar que a Cabala, em sua forma esotérica e teosófica, não faz parte da tradição cristã e é incompatível com a doutrina católica, que encontra a plenitude da Revelação em Jesus Cristo. Nosso foco aqui é estritamente na Gematria como fenômeno literário e histórico do período bíblico.
A Visão Católica: Entre a Simbologia e a Superstição
Fundamentos no Catecismo e na Dei Verbum
A Igreja Católica, em sua sabedoria, reconhece a riqueza da linguagem simbólica das Escrituras. A Constituição Dogmática Dei Verbum do Concílio Vaticano II ensina que a Sagrada Escritura deve ser lida e interpretada levando em conta “o conteúdo e a unidade de toda a Escritura, a Tradição viva da Igreja e a analogia da fé” (Dei Verbum, 12). Dentro deste princípio, está o reconhecimento dos gêneros literários, e o uso de números simbólicos é um deles. O Catecismo da Igreja Católica (CIC) frequentemente referencia este significado, como ao comentar os seis dias da Criação, afirmando que a obra culmina no sétimo dia, o Sábado, sagrado e fundamento estável (CIC 349). O número 7, portanto, não é um literalismo científico, mas um símbolo teológico da perfeição e aliança divinas.
A Advertência Contra a Superstição
O perigo sempre existe quando se troca a fé pela magia. O Catecismo é explícito ao condenar a superstição: “A superstição é um desvio do sentimento religioso e das práticas que impõe. Pode afetar também o culto que prestamos ao verdadeiro Deus… Atribuir eficácia exclusiva à materialidade das orações ou aos sinais sacramentais, sem levar em conta as disposições interiores que exigem, é cair na superstição” (CIC 2111). Portanto, buscar na Gematria um poder mágico, um código secreto para manipular a realidade, ou uma forma de adivinhação, é gravemente contrário à fé católica. A atitude correta é a de admiração contemplativa, não de utilização instrumental.
Tabela de Referência: Os Números Bíblicos e Seus Significados
A tabela a seguir oferece um resumo pastoral dos números mais significativos, servindo como um guia rápido para a lectio divina e o estudo bíblico.
| Número | Significado Principal | Exemplos Bíblicos Chave | Aplicação Pastoral |
|---|---|---|---|
| 1 (Echad) | Unidade de Deus | Dt 6:4; Ef 4:4-6 | Catequese sobre o Monoteísmo e a Santíssima Trindade. |
| 2 (Shnayim) | Testemunho, Aliança | Mc 6:7; Dt 19:15 | Importância da comunidade, do matrimônio, do testemunho. |
| 3 (Shalosh) | Perfeição Divina, Trindade | Is 6:3; Mt 28:19 | Mistério Trinitário, virtudes teologais, três dias da Ressurreição. |
| 4 (Arba) | Universalidade (pontos cardeais) | Ez 1:5; Ap 7:1 | Os quatro Evangelhos, a missão universal da Igreja. |
| 5 (Chamesh) | Graça | Jo 6:9; Mt 25:2 | Os cinco livros da Torá, as chagas de Cristo, os pães da multiplicação. |
| 6 (Shesh) | Humanidade, Imperfeição | Gn 1:26-31; Ex 20:9 | Dignidade da pessoa humana; o 666 como símbolo do mal. |
| 7 (Sheva) | Perfeição, Santidade | Gn 2:2; Ap 1:4 | Sete Sacramentos, Sete Dons do Espírito Santo, criação. |
| 12 (Shneim Asar) | Povo de Deus | Gn 49; Mt 10:1 | Doze tribos, Doze Apóstolos, fundamentos da Igreja. |
| 40 (Arbaim) | Provação, Purificação | Nm 14:34; Mt 4:2 | Quaresma, preparação para encontros decisivos com Deus. |
Os Números na Bíblia: Uma Chave de Leitura Teológica
O Número 1, 2 e 3: A Semente da Trindade
- 1 (Um/Echad): Representa a unidade e a unicidade de Deus (Dt 6:4: “O Senhor é nosso Deus, o Senhor é Um”). É o número da fonte primordial, do Princípio não criado.
- 2 (Dois): Simboliza o testemunho, a confirmação e a dualidade criada (céu e terra, homem e mulher). “Por boca de duas ou três testemunhas, toda a palavra será confirmada” (Mt 18:16).
- 3 (Três): O número da perfeição divina e da revelação trinitária. É o número da ressurreição (ao terceiro dia), da plenitude e da substância divina. A repetição “Santo, Santo, Santo” (Is 6:3) aponta para a Santíssima Trindade. A estrutura da oração de Jesus no Getsêmani (“afastou-se pela terceira vez para orar”, Mt 26:44) indica uma oração completa e perfeita.
O Número 7: A Perfeição que se Torna Sacramento
O número 7 é a assinatura de Deus na criação, mas também na redenção. A Igreja, guiada pelo Espírito Santo, discerniu na economia da salvação a presença dos Sete Sacramentos, sinais eficazes da graça que santificam todas as etapas e momentos importantes da vida do fiel: Batismo, Confirmação, Eucaristia, Penitência, Unção dos Enfermos, Ordem e Matrimônio. Esta estrutura setenária não é acidental; ela revela a completude da graça oferecida por Cristo. Da mesma forma, os Sete Dons do Espírito Santo (Sabedoria, Entendimento, Conselho, Fortaleza, Ciência, Piedade e Temor de Deus), baseados em Isaías 11:2-3, são concedidos em plenitude no sacramento da Confirmação, para nos fortalecer na vida cristã. O 7, portanto, de símbolo da criação perfeita, torna-se a estrutura da graça santificadora.
O Número 12 e 40: Os Números da Aliança e da Jornada
- 12 (Doze): O número da estrutura do Povo de Deus. As 12 tribos de Israel no Antigo Testamento são refeitas e perfeccionadas nos 12 Apóstolos do Cordeiro no Novo Testamento (Ap 21:12-14). A mulher do Apocalipse tem uma coroa de 12 estrelas (Ap 12:1), simbolizando Israel e a Igreja.
- 40 (Quarenta): O número da provação, purificação e preparação. É um período de transição.
- Antigo Testamento: 40 dias do Dilúvio (Gn 7:17), 40 anos de Israel no deserto (Nm 14:34), 40 dias de Moisés no Sinai (Ex 24:18), 40 dias de caminhada de Elias até Horeb (1Rs 19:8).
- Novo Testamento: Jesus é recapitulação de Israel. Seus 40 dias de jejum no deserto (Mt 4:2) são a antítese dos 40 anos de infidelidade de Israel. Ele vence onde Israel caiu. O período de 40 dias entre a Ressurreição e a Ascensão (Atos 1:3) é o tempo de instrução final e fundação da Igreja.
O Número 50 (Chamishim): Jubileu e Libertação no Espírito
O número cinquenta representa libertação, renovação e o dom do Espírito Santo. A cada cinquenta anos, Israel celebrava o Yovel (Jubileu), um ano de liberdade total: os escravos eram libertados, as dívidas perdoadas e as terras devolvidas aos seus proprietários originais (Levítico 25:10). Era um poderoso lembrete de que a terra pertencia a Deus e de que o seu povo era chamado a uma liberdade radical.
Este simbolismo encontra sua plenitude no Novo Testamento. Pentecostes (do grego pentekosté, “quinquagésimo”) ocorre cinquenta dias após a Páscoa. No Antigo Testamento, esta festa celebrava a entrega da Torá no Monte Sinai. No Novo, ela marca a efusão do Espírito Santo sobre os apóstolos (Atos 2), o nascimento da Igreja e a promulgação da “Lei nova” do Espírito no coração dos fiéis.
A tipologia é profunda: assim como a Lei foi dada cinquenta dias após o Êxodo (Páscoa), o Espírito é dado cinquenta dias após a nova e definitiva Páscoa de Cristo. O número 50, portanto, simboliza a transição da lei escrita para a lei do amor, da libertação do Egito para a libertação do pecado, do povo de Israel para o povo de Deus universal. É a plenitude do tempo (7 semanas = 49 dias) culminando em um novo e definitivo começo (o 50º dia).
O Número 666: A Marca da Imperfeição Revoltada
O “número da besta” em Apocalipse 13:18 é o ápice do uso da Gematria com fins teológicos no Novo Testamento.
- O Contexto de Perseguição: O Apocalipse foi escrito para comunidades cristãs sob a ameaça do Império Romano e do culto ao imperador (César é Senhor).
- A Técnica da Gematria: A besta é um “homem”, e seu número é 666. A interpretação histórica mais sólida aponta para o Imperador Nero César. Seu nome em hebraico (
נרון קסר, NRWN QSR ou Neron Qesar) soma perfeitamente 666 (N=50, R=200, W=6, N=50, Q=100, S=60, R=200). Um detalhe interessante: em alguns manuscritos antigos (como o Codex Ephraemi Rescriptus), o número aparece como 616. Isso ocorre porque a transliteração do latim Nero Caesar (sem o “n” final de Neron) soma exatamente 616, o que reforça a tese de que o número se referia especificamente a ele. - O Significado Teológico: O número 6 é a imperfeição (um a menos que o 7 perfeito). A tríplice repetição (666) é a pretensão máxima da imperfeição em se auto-divinizar. Representa o poder humano em sua rebelião total contra Deus, tentando imitar a Santíssima Trindade (333) mas falhando grotescamente. Não é um código para um futuro distante, mas uma denúncia profética do mal presente na época, que se repete em toda ideologia que coloca o homem ou o Estado no lugar de Deus.
Gematria no Novo Testamento: A Luz de Cristo sobre os Símbolos
O Novo Testamento, escrito em grego, também utiliza esse recurso, mas agora iluminado pela Pessoa de Jesus Cristo.

A Genealogia de Jesus (Mateus 1:1-17)
Mateus estrutura a genealogia de Jesus em três grupos de 14 gerações. Por quê? O nome David em hebraico (דוד) soma 14 (D=4, V=6, D=4). Mateus está usando a Gematria para proclamar, desde a primeira linha de seu Evangelho, que Jesus é o filho de David, o Messias prometido, e que sua história é o cumprimento perfeito das promessas divinas.
A Pesca Milagrosa de 153 Peixes (João 21:11)
Este é o caso mais famoso e mais debatido. Por que João se daria ao trabalho de contar e registrar o número exato de peixes (153)? Várias interpretações patrísticas e teológicas surgiram:
- Universalidade da Igreja: O zoólogo romano Plínio, o Velho, afirmava existirem 153 espécies de peixes. Assim, a pesca milagrosa simbolizaria a missão da Igreja de pescar homens de todas as nações (Mt 4:19).
- Gematria de “Icthus” (Peixe): A palavra grega para peixe, ΙΧΘΥΣ (Icthus), era um acrônimo para “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador”. A soma de suas letras (I=10, Χ=600, Θ=9, Υ=400, Σ=200) não dá 153, mas a conexão conceitual é forte. Uma conexão comum feita por Santo Agostinho é que 153 é a soma dos números de 1 a 17. O número 17, por sua vez, é a soma de $10$ (os Mandamentos) e 7 (os dons do Espírito Santo). Isso reforça sua tese de “universalidade” e “graça”.
- Gematria de “Os Filhos de Deus”: A frase hebraica “Benei Ha-Elohim” (Os Filhos de Deus) tem um valor numérico próximo ou igual a 153, dependendo da variação. Esta é uma das interpretações mais prováveis: a missão da Igreja é reunir todos os “filhos de Deus” que estão dispersos (Jo 11:52).
- Número Triangular: 153 é um número triangular (a soma de todos os números de 1 a 17). Na antiguidade, os números triangulares eram vistos como perfeitos e completos.
Independente da interpretação exata, o ponto de João é claro: a missão da Igreja, guiada pelo Cristo Ressuscitado, será frutífera, universal e precisa.
A Linguagem dos Números na Liturgia e Devoção Católica
O Pai-Nosso e os Sete Pedidos
A oração ensinada por Jesus possui uma estrutura setenária perfeita, abrangendo toda a realidade humana. Os três primeiros pedidos (“Santificado seja o vosso nome”, “Venha a nós o vosso reino”, “Seja feita a vossa vontade”) são teocêntricos, orientados para a glória de Deus. Os quatro últimos (“O pão nosso de cada dia nos dai hoje”, “Perdoai as nossas ofensas”, “Não nos deixeis cair em tentação”, “Mas livrai-nos do mal”) são antropocêntricos, voltados para as necessidades humanas. Juntos, formam um todo perfeito que nos ensina a ordenar nossos desejos segundo o coração de Deus.
O Rosário e sua Estrutura Numérica Complex
O Santo Rosário é uma oração profundamente numérica, um “saltério de Maria” com suas 150 Ave-Marias (correspondentes aos 150 Salmos). Dividido em quatro conjuntos de Mistérios (Gozosos, Luminosos, Dolorosos, Gloriosos), cada um com cinco décadas, totaliza vinte mistérios. Esta estrutura (150, 4, 5, 20) não é arbitrária: o 5 lembra as chagas de Cristo e a graça; o 4, a universalidade; o 20, uma completude. É uma escola de oração que, através da repetição, conduz à contemplação.
Os Sete Sacramentos: Economia da Salvação
A Igreja Católica reconhece sete sacramentos, sinais eficazes da graça instituídos por Cristo:
Sacramentos de Iniciação Cristã:
- Batismo: Nascimento para vida nova (João 3:5)
- Confirmação/Crisma: Plenitude do Espírito Santo (Atos 8:14-17)
- Eucaristia: Alimento espiritual (João 6:51-58)
Sacramentos de Cura:
- Penitência/Reconciliação: Perdão dos pecados (João 20:21-23)
- Unção dos Enfermos: Cura e fortalecimento (Tiago 5:14-15)
Sacramentos de Missão:
- Ordem: Ministério sacerdotal (1 Timóteo 4:14)
- Matrimônio: União sacramental (Efésios 5:31-32)
Esta estrutura setenária não é acidental, mas revela a completude da graça oferecida por Cristo para todas as dimensões e momentos da vida cristã.
Fundamento teológico: O Concílio de Trento (1545-1563) definiu dogmaticamente que há sete sacramentos, nem mais nem menos, instituídos por Cristo. Esta definição responde às contestações protestantes que reduziam os sacramentos a dois (Batismo e Ceia).
As Sete Dores e Alegrias de Maria
A piedade católica, atenta ao simbolismo, medita tradicionalmente nas Sete Dores de Nossa Senhora (da Profecia de Simeão ao Sepultamento de Jesus) e nas Sete Alegrias de Maria (da Anunciação à sua Coroação no Céu). Estas devoções estruturam a contemplação da participação única de Maria no mistério de Cristo, oferecendo um modelo de fé que permanece firme na dor e exulta na alegria.
A Arquitetura Sagrada: Números que Elevam a Alma a Deus
A fé católica sempre se expressou na beleza, e a arquitetura das igrejas é uma “Bíblia de pedra” onde o simbolismo numérico ganha forma. Na Catedral de Notre-Dame de Paris, os três portais representam o Juízo Final e a Santíssima Trindade, enquanto a rosácea com doze pétalas principais evoca os doze apóstolos, fundamentos da Igreja. As duas torres simbolizam o testemunho da Lei e dos Profetas. Já o genial Antonio Gaudí, na Sagrada Família em Barcelona, levou este conceito ao extremo. Projetou dezoito torres: doze para os apóstolos, quatro para os evangelistas, uma para Maria e a torre central, a mais alta (172,5m), para Jesus. Notavelmente, Gaudí planejou que esta torre não fosse mais alta que a colina de Montjuïc, em deferência à criação de Deus. Estes não são meros caprichos estéticos, mas teologia em pedra e concreto, destinada a elevar a mente e o coração dos fiéis às realidades celestes.
Perguntas Frequentes e Respostas Pastorais
1. Gematria é pecado para um católico?
Resposta: Estudar a Gematria como um fenômeno cultural e literário da Bíblia, para melhor compreender a mensagem divina, não é pecado. Pelo contrário, é um enriquecimento da fé. No entanto, é pecado (superstição) se alguém a utiliza para tentar adivinhar o futuro, tomar decisões baseadas em “números da sorte”, ou atribuir a ela um poder mágico independente de Deus.
2. Qual a diferença entre Gematria e Numerologia?
Resposta: A Gematria (no sentido bíblico) é uma ferramenta de interpretação de um texto sagrado para extrair significado teológico. A Numerologia é um sistema esotérico que busca significado e poder em números da vida cotidiana (nomes, datas), independente de um texto revelado. A primeira é uma disciplina hermenêutica; a segunda, uma prática divinatória.
3. A Igreja Católica proíbe o estudo da Gematria?
Resposta: Não, a Igreja não proíbe. Ela incentiva o estudo sério e contextualizado das Escrituras. O que a Igreja condena, e todo católico deve evitar, é o envolvimento com a Cabala esotérica e práticas de adivinhação, que desvirtuam o sentido autêntico da Gematria histórica.
4. Como posso usar esse conhecimento na minha vida de fé?
Resposta:
- Na Oração: Ao ler a Bíblia, preste atenção aos números. Quando vir o número 40, lembre-se de que é um tempo de graça e conversão. O 7, um convite ao repouso em Deus.
- Na Catequese: Use esses símbolos para explicar a beleza e profundidade da Bíblia para crianças e adultos.
- Na Evangelização: Mostre como a Bíblia é um texto inteligente e coerente, onde até os detalhes numéricos convergem para contar uma única história: a da Salvação em Jesus Cristo.
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Conclusão: Do Número ao Mistério, do Símbolo ao Sacramento
A jornada através da Gematria e do significado espiritual dos números nos revela um fato maravilhoso: o Deus da Criação é também o Deus da Ordem e da Beleza. Ele não apenas inspirou as palavras da Bíblia, mas também inspirou sua estrutura e padrões internos. Os números são como as pinceladas de um artista divino, que compõem um quadro muito maior do que a soma de suas partes.
No entanto, para nós, católicos, toda essa riqueza simbólica encontra seu cumprimento, seu sentido pleno e definitivo, em Jesus Cristo e nos Sacramentos da Igreja. Ele é o verdadeiro “Sacramento” – o sinal visível da graça invisível de Deus.
- O 7 encontra seu repouso final no Cristo que nos chama: “Vinde a mim, todos vós que estais cansados e oprimidos, e eu vos darei descanso” (Mt 11:28).
- O 40 é recapitulado no seu jejum e realizado no nosso próprio período quaresmal de conversão.
- A universalidade simbolizada pelo 153 se torna realidade visível cada vez que o Batismo incorpora um novo membro ao Corpo de Cristo.
Portanto, que a exploração da Gematria não nos deixe fascinados com os números em si, mas nos leve a uma admiração mais profunda pela Sabedoria de Deus. Que ela nos conduza, por fim, da sombra dos símbolos para a Luz daquele que é o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim (Ap 22:13), em quem todos os significados se encontram e todas as contas fecham: Jesus Cristo, Nosso Senhor.
Enriquecendo seus Conhecimentos
A seguir, indico obras que dialogam com os tópicos abordados neste artigo — referências que podem expandir sua compreensão e inspirar novas ideias.
O Sentido Espiritual da Liturgia
Edições CNBB
“A Bíblia de Jerusalém”
(pelas notas de rodapé acadêmicas).
Editora Paulus




